Recentes estudos sugerem que um sono sem sonhos - ou, pelo menos, aqueles em que de manhã não nos lembramos do enredo que o subconsciente criou - são os sonos mais recompensadores. Não ter sonhos precisos significa menos tempo em sono REM "Rapid Eye Movement" - aquele em que a actividade neuronal encefálica é igual à da vigília. No fundo, o sono REM é o que têm as pessoas que "mesmo a dormir, estão acordadas".
Também acontecem sonhos na fase IV do sono não-REM: são sonhos mais profundos, tranquilizantes, com actividade neuronal vestigial.
Durante a fase I e II do sono não-REM e em todo o sono REM, a probabilidade de acordar é grande. A fase I - já todos devemos ter passado por isto - acontece quando estamos calmamente a adormecer e de repente vemo-nos a cair sem rede. Às vezes, pontapeia-se o ar (ou a pessoa que está ao nosso lado). Dormir profundamente significa estar na fase III ou IV do sono não-REM.
Sonhar pode, portanto, ser mau. Acordar com dores de cabeça, fatigado ou mesmo exausto, ansioso, deprimido - tudo isto pode acontecer se o sono não for o suficiente para entrarmos na fase III não-REM. Na vida, também: ter sonhos, projectos claros e precisos daquilo que queremos que nos aconteça, daquilo que teremos de fazer para que as coisas ocorram, de tudo o que temos de construir para atingir certos patamares, pode vir a ser prejudicial, impedindo que esses mesmo sonhos se tornem realidade.
Toda, toda a vida sonhei demasiado: sonhei alto, todos os dias, sem esconder qur o fazia. Ir ali, viver acolá, ficar aqui, fazer isto, conseguir aquilo, tentar aqueloutro, conseguir tudo isto. Projectos, planos, expectativas - em demasia. "Ter expectativas é meio caminho andado para a desilusão" disseram-me há algum tempo, e eu, optimista, não concordei.
É muito mais simples não planear e viver ao sabor da corrente (irra! frase irritante!). Não esperar nada de nada, de ninguém, viver por viver simplesmente. Em vez de viver em pulgas, em acções de rápida movimentação dos olhos, desfrutar um dia de cada vez, sem grandes ideias sobre o amanhã. Pensar primeiro no que se vai jantar hoje antes de pensar no que se vai cozinhar amanhã. Fazer o que tem de ser feito hoje, em vez de programar minuciosamente as actividades do dia seguinte. Ler um capítulo de cada vez, em vez de pensar "acabo de ler este livro depois de amanhã".
Uma vida tranquila para batimentos cardíacos mais tranquillos. Com sonhos (o direito ao sonho é o direito à vida e pumba! mais um cliché!), mas dos apaziguadores, dos profundos, dos realmente importantes. Viver em fase IV não-REM - calmamente, sem pressas, sem exigências irreais. Nada mais interessa se formos grandes na vida.
25.11.07
24.11.07
Falar
Creio que falar, hoje em dia, está absolutamente sobrevalorizado. Toda a gente tem uma opinião a dar, toda a gente tem sempre algo a dizer sobre alguma coisa, qualquer coisa, tudo. Algo a acrescentar mesmo quando tudo já foi dito antes por outras pessoas. O mundo não é uma coisa nova, já cá está há milhões de anos e, mesmo assim, quem vive nele e sobre ele, julga que pode mandar bitaites sobre tudo.
Falar, hoje em dia, está sobrevalorizado. Repito-o porque tenho a certeza disto.
"Já falaram?". Merda para esta pergunta. Que se foda esta pergunta. Quero lá saber. Eu não quero saber se já falámos, eu não preciso de falar porque eu já sei. Não preciso de ouvir aquilo que já sei e que já sei porque o mundo gira há muito mais tempo (mas mesmo muito mais) do que aquele que por cá ando. O que me acontece já aconteceu a outras pessoas antes, está a acontecer a muita gente agora e vai acontecer a muita gente depois de mim.
Falar está completamente sobrevalorizado. Para que preciso de ouvir outra vez o que já sei. Ou, pior, muito pior, para quê falar se me vão mentir? Ou então vão me baralhar porque se vão contradizer, vão usar palavras diferentes para encher chouriços de frases, parágrafos, discursos vazios que nada dizem, para quê ouvi-los mais uma vez? Para além do mais, tenho muito medo daquilo que poderia ouvir. A sério. Mais vale viver sem palavras, sem essas verdades absolutas que se dizem quando se abre a boca.
Há tanto para dizer sem palavras. Ouvir para além da voz, perceber-se num olhar, num abraço, num sorriso, no desespero de um telefonema. Nesse sentido, já ouvi tudo o que tenho de ouvir.
As pessoas andam demasiado taxativas: ou se fez ou não se fez, ou se disse ou não se disse, ou se quis ou se foi embora. Para quê?
Quem me pergunta se já falámos (a mesma porra repetida durante um ano inteiro, é que cansa, caramba!) nunca parou para pensar. Porque, se o fizesse, saberia - olharia para nós, aqueles que deviam falar - sem precisar que eu o dissesse. Toda a gente já o sabe. Eu já o sei.
Saber é completamente diferente de assumir. Como um cancro. A pessoa sabe que tem um cancro, sabe o que é um cancro - um monte de células estúpidas que, um dia, por não terem mais nada para fazer e por assim estar inscrito no seu código genético, desatam a multiplicar-se, sabe quem tem de fazer tratamentos (tirar cirurgicamente um cancro, radiação, químicos), sabe que, se não se tratar, ou se já for tarde demais, o cancro estará metastizado - esse monte de células estúpido decidiu emigrar e fixar-se noutros sítios do corpo. Sabe que pode ficar mal. Sabe que pode morrer. Sabe, mas não precisa necessariamente de o assumir. Nem essa pessoa nem quem a rodeia, contornando a situação com "vais ficar bem" ou "vai resultar".
Ao mesmo tempo, não assumir é diferente de estar em negação. Porque a negação implica estar dormente, a verdade rolar sobre nós como se alisasse alcatrão e não nos afectar. Negar não é fingir que não sabe. Negar é não só fingir que não sabe mas também fingir que está tudo óptimo, nunca se esteve melhor, ó para mim tão feliz. Não assumir é, simplesmente, ainda não ter desistido. É saber que há mais, muito mais, do que aquilo que falam.
Vejamos o que poderia acontecer se tivéssemos, como toda a gente quer, falado - vejamos a coisa de uma forma generalista. Eu ouviria o que queria ouvir, independentemente daquilo que tivesse ouvido, mas o que me seria dito seria também dito de forma a contornar um monte de perguntas. Perguntas que eu nunca faria porque estaria mais do que satisfeita com o que estaria a ouvir.
Por favor, párem de me perguntar se já falámos. Não falámos - falámos uma vez, e de que me serviu? - nem vamos falar.
Era criar uma coima para quem falasse quando não há nada para dizer. Era ver este mundo em silêncio. Como ia saber bem!
Learn to say the same thing
What defeats people is a double confession.
One time they will confess one thing, on the next they will confess something else.
Talk to them, they will say:
Learn to say the same thing
Let us hope fast to saying the same thing.
Never give up, no never give up
If you're looking for something easy then you might as well give it up.*
* Cat Power "Say"
Falar, hoje em dia, está sobrevalorizado. Repito-o porque tenho a certeza disto.
"Já falaram?". Merda para esta pergunta. Que se foda esta pergunta. Quero lá saber. Eu não quero saber se já falámos, eu não preciso de falar porque eu já sei. Não preciso de ouvir aquilo que já sei e que já sei porque o mundo gira há muito mais tempo (mas mesmo muito mais) do que aquele que por cá ando. O que me acontece já aconteceu a outras pessoas antes, está a acontecer a muita gente agora e vai acontecer a muita gente depois de mim.
Falar está completamente sobrevalorizado. Para que preciso de ouvir outra vez o que já sei. Ou, pior, muito pior, para quê falar se me vão mentir? Ou então vão me baralhar porque se vão contradizer, vão usar palavras diferentes para encher chouriços de frases, parágrafos, discursos vazios que nada dizem, para quê ouvi-los mais uma vez? Para além do mais, tenho muito medo daquilo que poderia ouvir. A sério. Mais vale viver sem palavras, sem essas verdades absolutas que se dizem quando se abre a boca.
Há tanto para dizer sem palavras. Ouvir para além da voz, perceber-se num olhar, num abraço, num sorriso, no desespero de um telefonema. Nesse sentido, já ouvi tudo o que tenho de ouvir.
As pessoas andam demasiado taxativas: ou se fez ou não se fez, ou se disse ou não se disse, ou se quis ou se foi embora. Para quê?
Quem me pergunta se já falámos (a mesma porra repetida durante um ano inteiro, é que cansa, caramba!) nunca parou para pensar. Porque, se o fizesse, saberia - olharia para nós, aqueles que deviam falar - sem precisar que eu o dissesse. Toda a gente já o sabe. Eu já o sei.
Saber é completamente diferente de assumir. Como um cancro. A pessoa sabe que tem um cancro, sabe o que é um cancro - um monte de células estúpidas que, um dia, por não terem mais nada para fazer e por assim estar inscrito no seu código genético, desatam a multiplicar-se, sabe quem tem de fazer tratamentos (tirar cirurgicamente um cancro, radiação, químicos), sabe que, se não se tratar, ou se já for tarde demais, o cancro estará metastizado - esse monte de células estúpido decidiu emigrar e fixar-se noutros sítios do corpo. Sabe que pode ficar mal. Sabe que pode morrer. Sabe, mas não precisa necessariamente de o assumir. Nem essa pessoa nem quem a rodeia, contornando a situação com "vais ficar bem" ou "vai resultar".
Ao mesmo tempo, não assumir é diferente de estar em negação. Porque a negação implica estar dormente, a verdade rolar sobre nós como se alisasse alcatrão e não nos afectar. Negar não é fingir que não sabe. Negar é não só fingir que não sabe mas também fingir que está tudo óptimo, nunca se esteve melhor, ó para mim tão feliz. Não assumir é, simplesmente, ainda não ter desistido. É saber que há mais, muito mais, do que aquilo que falam.
Vejamos o que poderia acontecer se tivéssemos, como toda a gente quer, falado - vejamos a coisa de uma forma generalista. Eu ouviria o que queria ouvir, independentemente daquilo que tivesse ouvido, mas o que me seria dito seria também dito de forma a contornar um monte de perguntas. Perguntas que eu nunca faria porque estaria mais do que satisfeita com o que estaria a ouvir.
Por favor, párem de me perguntar se já falámos. Não falámos - falámos uma vez, e de que me serviu? - nem vamos falar.
Era criar uma coima para quem falasse quando não há nada para dizer. Era ver este mundo em silêncio. Como ia saber bem!
Learn to say the same thing
What defeats people is a double confession.
One time they will confess one thing, on the next they will confess something else.
Talk to them, they will say:
Learn to say the same thing
Let us hope fast to saying the same thing.
Never give up, no never give up
If you're looking for something easy then you might as well give it up.*
* Cat Power "Say"
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