9.6.08

Puta do calor. Puta de vida.

Chegou a casa sem destino. Isto é, como quem não queria ali chegar por ser grande a vontade de estar de rabo no ar, a espairecer na esplanada com a cara ao sol e a testa franzida para que os olhos se cerrem e protejam as íris dos ultravioletas. Por isso, pousou as chaves na mesa da entrada, um gesto automático e barulhento que avisa "cheguei!". Só que desta vez não avisava ninguém porque, entre as paredes pintadas a tinta de água cor casca de ovo, nenhum outro corpo exalava uma mistura desigual de oxigénio desperdiçado, dióxido de carbono e água para além do dele. Nada mais se movia que não a cortina junto à janela que deixara aberta nessa manhã para arejar, até porque o corpo dele mantivera-se estático, irritado por ter subido os três andares daquele prédio nos subúrbios para entrar naquele apartamento mortiço em vez de se ter deixado ficar na esplanada, cara ao sol, testa franzida, olhos fechados, íris protegidas.

Voltou a chamar-lhe um nome, um palavrão rasca, uma classificação que ela provavelmente não merecia.

Puta.

Puta de merda.


3 comments:

Anonymous said...

Trabalhinho que faz bem.

Anonymous said...

life sucks, and in the end we'll all dye.

Anonymous said...

...E depois sorriu. Soube-lhe bem!
Ainda com o sorriso no rosto congratulou-se por conseguir tirar prazer da sua decadência.
robin