Porque o João já tem oito anos e tornou-se um miúdo cheio de pinta e fomos juntos ver o nosso Benfica, e eu comprei-lhe uma camisola que dizia Simão, e o puto todo contente a mostrá-la aos filhos dos outros gajos lá no estádio, sem ligar nenhuma ao jogo, e quando foi golo, eu chamei-o "João, pá, viste o golo?" e ele todo contente "Foi o Simão?".
Porque a Margarida tem 5 anos e ainda anda de chucha na boca, a pediatra diz que não é para se preocupar porque na primária ela vai sentir vergonha e vai acabar por desistir de andar sempre a chuchar borracha, e tem tanta graça porque já usa palavras difíceis, como amizade e igualdade ( palavras difíceis para a idade, pois), só que tem sempre a chucha e as palavras soam cheias de cuspo e de interferências como um rádio distante, mas temos grandes conversas com ela ao meu colo sobre os amigos do infantário. E a miúda é mesmo uma querida, e é igual à mãe com os caracóis louros e os olhos cinzentos, é linda, ela, são lindas, as duas.
E depois há o Henrique a quem me ando a habituar a chamá-lo de filho porque só anteontem veio lá para casa, tem onze anos e um passado de quem tem quarenta anos como eu, uma mãe alcoólica, um pai monstruoso, uns irmãos que em vez de jogarem Playstation, conheceram pistolas e assaltos à mão armada. Mas nós estamos dispostos a velar por ele e a fazer desta casa, o seu lar e desta família, a sua família, e a cada minuto que passa gosto mais dele, de como é calado, obediente e de como nos olha com a mesma gratidão que olhamos para ele, porque ele veio preencher um vazio na nossa vida, um vazio que não sabíamos existir.
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