Sentou-se à beira da cama no seu quarto e estragou o aprumo em linhas rectas do edredão estendido. Um edredão uma vez branco agora amarelado, com relevos de losangos e hexágonos como uma bola de futebol. Como se fosse robotizado, pegou na sua mão direita e alisou as pregas do seu peso, o edredão novamente liso estendia-se agora até às duas almofadas de baínhas rendilhadas, altas, simétricas. À frente dele, um toucador com gavetas, um espelho onde evitava ver-se reflectido. Não precisava, já se sabia de cor. Àquela hora da madrugada (em que o sol ainda não nascera mas a noite já não estava cerrada), sabia que a directa lhe cavara olheiras negras e fundas sob os olhos, o álcool lhe secara os lábios, que empalideceram gretados e o cansaço o emagrecera. Garante sempre a si mesmo que não voltará a repetir noites destas - define-as assim "noites destas", por não saber distinguir esta de outras, por não saber discriminar isto daquilo, as duas das cinco da manhã. Sabe de um jantar em casa de um amigo, sabe de umas bebidas, sabe do sabor doce dos lábios de uma mulher (primeiro nos seus, depois no seu sexo, numa casa de banho enquanto ela lho chupava), sabe de ter voltado a olhar para ela quando ela subiu pelo seu corpo acima, levantando os joelhos do chão mijado e de como lhe veio o vómito à garganta, sabe só mais ou menos do táxi que o levou a casa.
Deixa cair o telemóvel no chão e o silêncio é tal que parece um tiro surdo. Deita-se com medo, treme, espera uns largos minutos. Apercebe-se que não foi desta que morreu e soergue-se. Há algo de extremamente asqueroso nisto tudo, vómito, sémen, o seu suor, que ignora propositadamente. Volta a fitar o telemóvel muito concentrado, tenta escrever uma sms. Primeiro não consegue abrir o separador "Criar mensagem nova", depois quando finalmente abre não sabe o que ia a escrever. Continua com o telemóvel na mão e descalça-se, a sola dos sapatos pegajosa. Lembra-se "Cheguei a casa. bjs" com muitos números e éles pelo meio porque não acerta nas teclas. Agora esqueceu-se do destinatário. Perde a paciência, manda o telemóvel para o chão.
Silêncio, outra vez. Já não se voltou a assustar com o barulho da queda. Puxa uma almofada e espalha-se na cama na perpendicular, os pés para o lado da janela, à esquerda. Já amanhece.
Antes de adormecer vem-lhe à cabeça que bebeu whisky. Ainda fecha os olhos com força mas não lhe ocorre mais nada. Subitamente, um novo silêncio, mais vazio, mole, caramelizado.
2 comments:
:)
só a ninguém mo chupa.
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