6.10.08

Despenso-te.

Sou uma velha carapaça que escreve madrugada a fora, quando até a noite dorme refugiada no seu próprio sossego. Trevas para mim são trevas, são horas de lidar com incongruências, com espíritos, com comicotragédias mal resolvidas.

Como um terrorista experiente, tento esquecer-te usando os truques já usados - a colocação estratégica de explosivos nos pontos vitais da estrutura do edifício. A sustentação está, por si, frágil, se pensarmos que são as coisas que nos unem (um rol de coisas, que não me canso de enumerar para mim mesma) versus as que nos separam (um mar de distância, até literalmente) que a aguentam. Tento minar-nos por dentro, desprovendo-nos de finalidade, de sentido.

(O Mexia também teve o telemóvel avariado. Ficou sem mensagens. Já o problema do meu é articular, quando voltar, terá todas as mensagens alinhadas, azar o meu.)

Eu tento esquecer-te até pensar em ti. Depois apercebo-me, espera, estou a pensar em ti de novo, deixa-me despensar, e despenso - porque não pensar em ti é diferente de esquecer-te, então inventei uma palavra nova.

Tal como demorou eternidades para gostar de ti, agora custa-me horrores a deixar-te. Now isn't it funny. Tem tudo a ver: tornei-me resistente a encantos e imunizei-me contra desencantos, nem um nem outro me afectam sobremaneira.

De maneira que, bem vistas as coisas, enganei-me redondamente quando achei que toda eu fosse dispensar-te ao despensar-te. Quis esquecer-te, quando, na verdade, acabei por ter saudades de pensar em ti.

Enfim.

2 comments:

Anonymous said...

"The sadness of things".

mbmac said...

Tenho um personagem que passa as noites a desfolhar os mesmos pensamentos que este. O mundo vai girando sobre si e as pessoas são todas diferentes, mas a dor é curiosamente sempre igual.. Porque será que sofremos todos dos mesmos males? E porque é que não se encontrou ainda a cura, se todos temos a mesma doença?!

Subscrevo-te, nas tristezas da vida.