28.2.07

Hip-hop de raízes e folhas

No meio de tanta música, às vezes não há nada que eu oiça e que me encha as medidas. Nada, nada. As audições tipo cultura intensiva, em que nenhuma parcela de terreno é deixada em pousio, e o mesmo disco gira ininterruptamente (não sejam preciosistas e pensem "hey mas tu não tens gira-discos!", que eu sei nem um cd gira nem há mp3s que andem aí à roda dentro do disco rígido, mas para o caso pouco interessa), ... Onde é que eu ia? Ah, isso. O disco gira ininteruptamente e eu ou saturo ou deixo de me identificar com o disco a certa altura (uma forma mais elaborada de saturação, na verdade). Nesses dias estou tão musicalmente descomprometida (e com tanto tempo livre em mãos -- viva as férias de Carnaval!) que viajo pela internet a fora a ouvir as quatro faixas que cada artista com quem me cruzo disponibiliza no seu myspace.

(Introdução caótica para dizer que hoje trouxe ao Desumanos um artista que apenas conheço de faixas no myspace e no youtube.)

E o que é que me encheu as medidas depois de dois meses a ouvir folk e cantautores e bandas indie? O quê, meus amigos? Hip-hop vindo de Toronto com cheiro a África. (A prova que o Canadá não morreu com os Arcade Fire.)

K'Naan não é novidade para muita gente e o nome não me era estranho, porque esteve presente no belíssimo, enorme, genial, sublime e outras hipérboles que tais Festival de Músicas do Mundo de Sines - edição de 2006, onde eu tive o prazer (juntar aqui hipérboles não utilizadas na expressão acima) de estar presente a um só dia de concertos para ver o Toumani Diabaté, tendo acabado a noite apaixonada pelos Gaiteiros de Lisboa (ADIANTE! chiça, que isto da verborreia é patológico!). Sinceramente não me lembro se os meus amigos que lá estiveram gostaram (ou não) do concerto do K'Naan.

A música de K'Naan não cheira só a África, como vos disse primeiro. A música fede a África, transpira África, é um bocadinho de África. O rap, não sei se sabem, tem origem numa ancestral tradição de contar histórias através da poesia entre pais e filhos (ao menos, foi isso que eu li e é uma origem bonita, por isso, se não for, who cares?). O que o K'Naan faz em todas as canções que já ouvi dele é transpôr essa tradição e fazer poesia sobre música quase tradicional. Ouvem-se cordas, guitarras, palmas e percussões. A voz - e a poesia - é usada como instrumento musical, ou seja o flow (acho eu, não percebo nada disto) é ferpeito.

Poderíamos estar algures na África Central numa celebração de uma tribo que isso não nos provocaria a mínima estranheza (mas provocaria a máxima comoção, o que é assunto para outro post), mas não, estamos numa cidade, onde há trânsito, pessoas a mais, companhia muitas vezes a menos.

Numa altura em que o hip-hop que oiço é urbano e contém os contornos da cidade, a profundidade das estações do metro e velocidade dos passos na calçada, foi bom descobrir que o hip-hop pode regressar à música que mais o influenciou para criar canções mais terra e menos betão. Há festa na In the beggining (música do camandro), os pés e as ancas não conseguem evitar mexer-se mal começa e o corpo perde todo e qualquer peso aos 57 segundos.

A conferir aqui.

A pedido de várias famílias, vídeos do youtube! :D


K'Naan conta a sua história (depois de ver isto, não é preciso ler mais nada!)


K'Naan :: Struggling (esta canção não está no myspace)


K'Naan :: Soobax (tãããããããão bom)

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